Queria
ter uma licença dessas de governo para interesses particulares e poder, enfim,
entregar-lhes a obra que há tanto matuto diariamente em minhas
entranhas para finalizar, quem sabe um dia, e em tempo de
revelar-lhes a minha face mais genuína e verdadeira, que anda oculta e
transviada ante às mazelas e às nuanças do dia-a-dia, disso que costumo chamar
por labuta e que usamos, tem vezes, para alimentar-nos durante os trilhos que
nos levarão até um lugar onde a gente possa se encontrar. Eu, comigo e com a
gente mesmo. A nossa verdadeira face um pouco mais desnuda e desfigurada da
forma como lhes apresento hoje, a minha pessoa torta, essa segunda pessoa carregada
por consoantes e vírgulas mal escritas, mal ditas, essa pessoa plural e
impessoal que estou hoje, carregada de angústias e feridas. Um eu desencontrado
e desencantado, muito embora achado facilmente em uma esquina dessas
quaisquer entregue àquilo que não me pertence, mas que faz-me dar conta do tipo faz de contas, motor
da alma, e nisso vou vivendo a angústia de quem quer seguir, e tenta, mas não
consegue por estacionado estar em um lugar supostamente inalcançável e
indecifrável, pois é difícil estimar, e um pouco vago também. Pois não há
ferramentas suficientes para ludibriá-lo, insisto, esse caminho tênue que escolhi para
seguir e de onde eu não posso sequer cavar um drible desses que os candidatos a
craques da vida conseguem com tanta destreza como de quem simplesmente vivo
está, e o estão em demasia ao contrário de mim, posto que na estrada onde perneio, e esperneio, onde vago em montanhas frias, sombrias
e distantes de onde eu queria estar, gélidas que são, ou de onde eu poderia estar, o assassinato da
minha alma e a morte da minha escrita e do livro que caminho a passos largos
para entregar-lhes parecem-me iminentes e assombram-me em cada passo em rumo
ao lugar mais incerto possível onde eu poderia querer chegar ou onde eu pudesse ter alguém
para tocar, um outro eu para sentir, sentido-me então estaria. Mas desisto-me de mim antes mesmo de alcançar, ou de tentar, indelicado que
sou, e também de achar qualquer luz no fim do túnel ou da ponte dessa estrada
longa e imaginária que já foi amarela um dia, breu que está da forma como os meus dias se apresentam, pois continuo aqui querendo-me encovado
nesse caminho sujo de poeiras das tréguas do mundo e do passado onde eu me encontro hoje, em
tiroteio dilacerante, desvanecido que sou.
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