o
dia está lindo e eu devia mesmo era querer trabalhar, paquerar, protestar,
passear, ir à praia ou ao clube, quem sabe uma praça porque estamos em época de
ocupação e de amplas discussões, vençamos, vejo muitos amigos alaranjados por
aí e outros já mais estranhos que outrora amarelando-se, que me entendam, enquanto
eu ao contrário sinto-me ainda verde em meio a tudo isso precisando
amadurecer-me. vejo um verde-cinza meio que sem cor quando olho ao espelho e
talvez seja a pior das sensações que eu pudesse ter por agora ou a melhor, pois
quem sabe não funcione como um último gatilho. mas por hora, e talvez também
por isso, isso de metade que eu digo, essa falsa liberdade que transcorre-me
pelos olhos dos outros, pelos atos dos outros, tenho comigo apenas a escolha do meu edredom escuro mesmo
sabendo que eu possa suar em demasia ou arder em fogos por enquanto artificiais
tamanha é a chama nesse meu peito tímido, calado e escondido querendo se
explodir, e talvez eu pague esse preço, mas sabendo-me também que esse edredom ao contrário talvez revele-se
frágil e límpido como se despertador alegre ou como se nuvem desfazendo-se ou como se sorvete derretendo-se
ou até mesmo belo como se me cobrisse com flores lindas e cheirosas, margaridas,
bromélias, camélias e rosas muito coloridas confortando-me então. e nesta
possibilidade iminente eu me sentiria um pouco mais leve, e livre, e solto, e querido,
mesmo ciente ainda que esse lugar onde decidi enterrar-me por agora estagnado possa
ser bastante diferente do que eu imaginava, nem um e nem outro, nem ao céu e
nem ao mar, e me bastariam agora apenas o céu ou o mar, mas jamais esse clima
mediano que impregna as minhas roupas já sujas com esse veneno cruel de alguns
ímpares que se acham pares, ignorantes que são, porque a minha vontade era
desprover-me por completo dessa blindagem de uma vez por todas e encará-lo de
frente, o mundo como está hoje, triste, sombrio e confuso, e poder enfim levantar
bandeiras e brincar de ser feliz. seria bom, e portanto lamento já exausto do tanto
pensar que mesmo sendo uma escolha exclusivamente minha ainda resida em mim certo
receio, um medo que corre intermitente em minhas veias e impede-me abrir de
súbito as janelas da vida e deparar-me de peito cheio e olhos esbugalhados e
sangrentos com as dúvidas tão cruéis que me rondeiam sobre decidir-me sóbrio
por partir, ou fugir, ou ficar tentando-me diferente. contudo escolhas seriam bem-vindas, mesmo que dilacerantes, pois talvez não fossem
certeiras de imediato, mas de que importa tudo isso e todos esses
questionamentos inseguros e arrogantes se permitiram-me, ao menos e de imediato, respirar um pouco mais, voltar a sorrir, a brincar, a pular, a berrar, a colocar camisas de cores mais vivas e diferentes e a sentir-me vivo e
meu, sobretudo, então por que não arriscar, cara pálida?
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